28 março, 2010

O Sono das Águas



Há uma hora certa,
no meio da noite,
uma hora morta,
em que a água dorme.
Todas as águas dormem:
no rio, na lagoa,
no açude, no brejão, nos olhos d’água,
nos grotões fundos.
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir...
Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.
O orvalho sonha
nas placas da folhagem.
E adormece
até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes...
Mas nem todas dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,porque a água dos olhos
nunca tem sono...


(João Guimarães Rosa)

Um comentário:

RosanAzul disse...

Oi Regina!
Acabei de postar um poema e chego aqui encontro a mesma conta...
Linda postagem! Amei! Parabéns...
Um lindo domingo!
Beijos,
RO